sábado, 12 de abril de 2014

O RINOCERONTE (RS)

Foto: Alisson Fernandes





O esfacelamento das aparências

Ao assistir “O Rinoceronte” na Usina do Gasômetro, me veio à mente outro espetáculo que eu assisti este ano, "Medida Provisória", pelo fato que este trabalho trazia à tona a questão das políticas públicas sobre o projeto Usina das Artes, e sobre a questão precária do espaço público destinado a cultura. E a questão do espaço em “O Rinoceronte” é muito latente, principalmente em dois aspectos. O primeiro é relacionado à questão do espaço físico, do espaço destinado à representação, o espaço da Sala 309, que por questões de infiltrações e de segurança não pode contar com iluminação teatral, sendo que a produção teve que improvisar uma iluminação parca e precária para dar conta da peça, sendo que os profissionais tiveram que trabalhar com mínimas condições para não cancelar o espetáculo, como aconteceu com outros trabalhos no inicio do ano em vários teatros da cidade. 
O outro aspecto é relacionado ao espaço da encenação teatral, da boa utilização da sala 309, sendo que a medida que a narrativa avançava, o cenário ia sendo destruído e re-construído, a cada novo espaço, desvelando sob a ótica absurda comportamentos banalizados de uma sociedade conformista. 
Guadalupe Casal através de sua direção consegue dar ao trabalho uma abordagem inusitada e contemporânea, conseguindo retirar do texto de Ionesco uma série de questões atuais, principalmente as metáforas relacionadas ao questionamento de velhos hábitos e comportamentos enraizados, e da própria condição humana, possibilitando a apresentação da realidade sob um ponto de vista inusitado, incitando um pensamento crítico sobre o ser humano e sobre o mundo. 
O elenco é coeso e está a altura da proposta de renovar o texto de Ionesco através de uma abordagem contemporânea, característica do grupo Sarcáustico que potencializa a fisicalidade dos atores e sua disponibilidade. Todos estão entregues e submersos no universo paquiderme, porém destaco a cena final entre Rafael Becker e Amanda Novinski, pois justamente ali, temos a síntese de toda a peça, ou seja, a transformação de hábitos e pensamento de toda uma sociedade, o esfacelamento das aparências. 
Trata-se de um bom espetáculo, demostrando que para se fazer teatro é preciso uma direção criativa, um elenco disponível que abrace a concepção e um público receptivo, se puder contar com uma bela iluminação, ok, se não puder contar, conto com ideias criativas, e isso se tem muito neste grupo. 


Elenco: Amanda Novinski, Carla Gasperin, Daniela Reis, Débora Maier, Heloisa Medeiros, Lucas Schmitt, Paula Souza, Rafael Becker e Thaize Ribeiro. 
Direção: Guadalupe Casal.
Colaboração cênica: Ricardo Zigomático.
Iluminação: Maíra Prates.